Covid-19 versus direito ao trabalho

Por Dr. Ali Armando Amade
Covid-19 versus direito ao trabalho
Trabalhei durante 5 anos, com contrato de trabalho regular (indeterminado), no restaurante duma unidade hoteleira nas belas praias da Província de Inhambane. Antes da Pandemia da COVID-19 tínhamos sempre muitos clientes. Infelizmente, desde Abril do ano passado (2020) o empreendimento ficou encerrado, precisamente devido à COVID-19. Todos nós, trabalhadores, fomos dispensados e ficámos em casa à espera que os tempos melhorassem. Nos finais do ano passado, o restaurante reabriu, mas, lamentavelmente, eu e alguns colegas não fomos chamados para retomar o trabalho, portanto, fomos deixados em casa sem nenhuma remuneração. O que é que temos que fazer com a unidade patronal?
(Carta assinada – Inhambane).
As praias da Província de Inhambane são por excelência um cartão-de-visita para muitos turistas moçambicanos (internos) e estrangeiros, visitantes de fora do nosso país que querem se deliciar daquelas maravilhosas praias. Falar de turismo é o mesmo que falar duma actividade que implica a deslocação de um ou vários indivíduos de sua zona habitual para outra durante um determinado período de tempo. Deslocação, tanto por lazer ou alguma actividade profissional facto que, naturalmente, implica a procura de unidades hoteleiras para a hospedagem. E, ao se instalarem nas referidas instâncias turísticas, vão manter contactos físicos ou de aproximação com outras tantas pessoas.
Desde finais de 2019 o mundo começou a confrontar-se com um novo Vírus da família dos Coronavírus, o SARS-COV-2, identificado em Wuhan na China, COVID-19. Como se sabe, a transmissão é feita por meio das gotículas respiratórias, ao tossir ou espirrar, ou ao tocar em objectos contaminados e levar a mão à boca, nariz e olhos sem antes higienizá-las.
Foi com vista a reduzir o máximo possível a propagação do COVID-19, que o Governo de Moçambique e um pouco por todo o mundo, fechou as fronteiras nacionais, cancelando, por isso, as viagens para o nosso país. A medida de fechar as fronteiras, praias, estâncias turísticas, etc. afectou sobre maneira o sector hoteleiro (incluindo os restaurantes e outros similares) que, sem clientes, se viu forçado a encerrar as portas e, por conseguinte, a despedir ou suspender alguns contratos de trabalho.
Feita a explicação do porquê da suspensão dos contratos de trabalho, agora vamos responder à inquietação do nosso querido amigo trabalhador dum restaurante, com contrato de trabalho por tempo indeterminado há mais de cinco anos e neste momento em casa sem a competente remuneração.
Falámos nas linhas anteriores de duas figuras jurídicas, nomeadamente o despedimento e a suspensão do contrato de trabalho. E será precisamente sobre esta última figura que nos vamos debruçar visto ser a que se adequa à situação no nosso amigo.
Dispõe o n.º 1 do artigo 123 da Lei 23/2007, de 1 de Agosto (Lei do Trabalho) que “o empregador pode suspender o contrato de trabalho por motivos de mercado, tecnológicos, catástrofes ou ocorrências que tenham ou venham, previsivelmente, a afectar a actividade normal da empresa ou estabelecimento”.
Significa que o contrato de trabalho pode ser suspenso por força maior quando, por exemplo, se verifiquem motivos conjunturais que obriguem o encerramento temporário da empresa.
Dos direitos adquiridos
Ora, pese embora esse direito reservado ao empregador para suspender temporariamente o contrato de trabalho mediante uma comunicação, por escrito, a cada trabalhador abrangido, os fundamentos da suspensão e indicada a data de início e de duração da mesma, remetendo simultaneamente cópias dessas comunicações ao ministério que tutela a área do trabalho e ao órgão sindical da empresa, conforme o n.º 2 do artigo 123 da Lei do Trabalho, não quer dizer que o trabalhador fica em casa sem remuneração ou com “as mãos a abanar” como se diz. Pois, o n.º 5 do mesmo artigo 123 da Lei do Trabalho, recomenda que mesmo estando em casa, devido à suspensão do contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber 75% do seu salário no primeiro mês, 50% no segundo mês e 25% no terceiro mês. Contudo, se passarem os três meses e o motivo que originou a suspensão prevalecer, suspende-se o pagamento das remunerações, podendo as partes (se quiserem) acordar a extinção do contrato ou relação de trabalho, sem prejuízo das indemnizações a que o trabalhador tiver direito.
Portanto, caro amigo, como pode perceber na nossa resposta, tinhas o direito de receber o teu salário durante três meses nos moldes que já indicámos. Mas se o encerramento continuasse, o que não é o caso, podiam (tu e a direcção do restaurante) acordar a extinção do contrato de trabalho e por conseguinte ser paga a competente indemnização.
E, uma vez recebido o valor da indemnização por sua parte, cessavam todos os direitos e obrigações com a sua entidade patronal.
Ora, no caso que tudo o que explicamos não tenha acontecido e até à presente data continue em casa, sem ter recebido qualquer valor monetário desde a suspensão do seu contrato de trabalho, aconselhamos ao nosso caríssimo amigo para, querendo, pedir ajuda, ao IPAJ, à Inspecção Provincial do Trabalho e ou ao Centro de Mediação e Arbitragem Laboral aí na cidade de Inhambane.
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Despedimento (extinção do contrato ou da relação de trabalho)
Se o impedimento referido n. 1 do artigo 123 da Lei de Trabalho subsistir, para além dos 3 meses, e houver um acordo para a extinção do contrato ou relação de trabalho, o empregador deve colocar à disposição do trabalhador ou trabalhadores, compensação pecuniária calculada nos termos do artigo 128 da Lei de Trabalho, podendo a indeminização ser fraccionada em três parcelas, mediante acordo das partes.
O que recomenda o artigo 128 da Lei do Trabalho?
O n. 2 deste artigo 128 da Lei do Trabalho recomenda que a rescisão do contrato de trabalho por tempo indeterminado, com justa causa porte do trabalhador, confere-lhe o direito à indemnização a 45 dias de salário por cada ano de serviço. No que tange aos contratos a prazo certo, cujo suporte legal se encontra no n. 3 do mesmo artigo, a indemnização será correspondente às remunerações que se venceriam entre a data da cessação e a convencionada para o fim do prazo do contrato.