LIMITES, PERIGOS E DESVIOS DO MOVIMENTO APOCALÍPTICO

LIMITES, PERIGOS E DESVIOS DO MOVIMENTO APOCALÍPTICO

Frei Carlos Mesters, Carmelita

9ª Chave

LIMITES, PERIGOS E DESVIOS DO MOVIMENTO APOCALÍPTICO

  1. Perigo de imobilismo e fatalismo

O movimento apocalíptico ensina e sugere que o Plano de Salvação já está pronto e definido. Por isso, corre o perigo de alimentar o fatalismo que impede ou desaconselha a participação das pessoas. Assim, na comunidade de Tessalônica, muitos cruzavam os braços e ficavam em cima do muro, sem comprometer-se. “Se Jesus vem logo, para que trabalhar ainda?” (cf. 2Ts 3,11). O mesmo fazem hoje os que, em nome do evangelho, recusam ou condenam a participação na transformação da sociedade. A resposta de Paulo é clara: “Quem não quiser trabalhar, também não coma” (2Ts 3,10)!

  1. Perigo de isolamento e de alienação

O movimento apocalíptico ensina que os pobres, perseguidos e ameaçados pelo império, são o povo eleito de Deus a ser salvo no Dia de Javé. Por isso, este “povo eleito” corre o perigo de considerar-se um “povo privile­giado”, os únicos eleitos a serem salvos! Eles sofrem a tentação de se isolar no seu privilégio e de tratar os outros com uns pobres condenados! Em vez de realizarem a sua missão de “servir à humanidade”como “luz das nações”, passam o tempo can­tando, esperando pela vinda de Jesus, tentando puxar todos para dentro da sua igreja ou do seu grupo. Esta atitude transpa­rece nos discípulos, depois da ascensão de Jesus. Ficavam olhando para o céu, esquecendo a missão do anúncio (At 1,11). A recomendação do livro dos Atos dos Apóstolos é clara: “Deixe na mão de Deus a preocupação com o fim do mundo, e vá pelo mundo para dar testemunho do Evangelho” (cf. At 1,7-8)!

  1. Perigo da manipulação que usa o Apocalipse para meter medo no povo

A experiência de Deus é um mistério fascinante de amor que atrai. Ao mesmo tempo, ela nos faz sentir nossa pequenez e pecado. No Apocalipse, a experiência de Deus se revela em visões que anunciam catástrofes. Muita gente, inclusive Daniel e João, ficam com medo diante destas visões (Dn 7,15; 8,17; Ap 1,17). Há pessoas que usam estes textos para meter medo nos pobres. Manipulam as visões do Apocalipse para dominar as consciências atra­vés da ameaça do castigo. Fazer isto é uma forma de idolatria. Mas Deus não quer que o anúncio do castigo para os maus cause medo nos bons. Sem cessar manda repetir o apelo: “Não tenham medo” (Ap 1,17)!, “Não chore” (Ap 5,5)! Por causa dos eleitos, Deus até abreviou as dores do fim dos tempos (Mc 13,20).

  1. Perigo de fundamentalismo.

Nem sempre o vidente entende a visão que recebe (Ap 7,14; Dn 8,15). Esta obscuridade das visões junto com a situação de sofrimento em que se encontram as pessoas traz consigo o perigo do fundamentalismo que interpreta tudo ao pé da letra. “O fundamentalismo é uma grande tentação que, em épocas de incerte­za e de inseguran­ça, se instala na mente de muita gente. Ele separa o texto da vida e da história do povo e o absolutiza como sendo a única manifestação da Palavra de Deus. A vida, a história do povo, a comunidade, já não teriam mais nada a dizer sobre Deus e a sua Vontade. É a ausência total de consciência crítica. O funda­mentalismo distorce o sentido da Bíblia e, na sua interpretação, alimenta o moralismo, o individualis­mo e o espiritualismo. É uma visão alienada que agrada aos opressores, pois impede que os oprimidos tomem cons­ciência da iniqüidade do sistema montado e mantido pelos poderosos” Recusando o pensa­mento crítico e o bom senso, o fundamentalismo pode transformar-se em causa de tragédias. Por exemplo, durante o cerco de Jerusalém no ano 70 depois de Cristo, grupos apocalípticos luta­vam entre si, exterminando-se mutuamente. Depois da destruição de Jerusalém, os sobreviventes comete­ram suicídio coletivo em Massada. No século XX já tivemos o suicídio coletivo de vários grupos fundamentalistas. O documento da Pontifícia Comissão Bíblica da igreja católica, “A Interpretação da Bíblia na Igreja”, pu­blicado em 1993, condena fortemente os desvios e os perigos do fundamentalismo.

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