As consequências da saída da Vale
A saída da Vale Moçambique, multinacional que explorava o carvão em Moatize, não só significa perdas fiscais para o cofre do Estado moçambicano mas também perda de benefícios para a população de Moatize. Porém há duas faces da mesma medalha a ter em conta.
1ª face: Lembramos que a mineradora Vale Moçambique desde a sua implantação em Moatize (Tete) trouxe uma nova forma de ser e estar na população local. Desde então um dos seus maiores desafios foi o desenvolvimento e formação de recursos humanos. Garantindo desta forma postos de emprego a mais de 13 mil pessoas, entre eles trabalhadores próprios e terceiros e cerca de 85% dos trabalhadores próprios são quadros nacionais. Contribuindo desta forma para a redução do índice de desemprego a nível da província de Tete e em concreto na cidade de Moatize.
Benefícios socioeconómicos
A Vale Moçambique garante de forma directa postos de trabalho aos seus trabalhadores directos e de forma indirecta gera emprego contratando empresas para prestarem serviços à própria Vale.
Esta mineradora tem contribuído de forma significativa na melhoria de vida da população da cidade de Moatize. Importa destacar o contributo desta na melhoria das infra-estruturas públicas e sócias como escolas, hospitais, vias de acesso, fornecimento de água potável para a população, apoio ao auto sustente através de fornecimento de sementes e apoio técnico especializado às comunidades.
Desde 2012, a Vale Moçambique vem implementando programas de geração de renda e empreendedorismo tendo distribuído 100 hectares de terra arável e sementes a 200 famílias, nesta mesma altura implantou o projecto de rendimento comunitário no qual faz formação de produção aviária e posteriormente fornece pintos para que cada família gere seu próprio sustento através deste.
A Vale possui viveiros um dos quais se localiza em Tete, local onde são produzidas mudas a fim de incentivar o plantio de árvores e consequentemente a preservação da fauna regional, e ainda através desta actividade garante ainda mais postos de trabalhos para jovens moçambicanos.
Por estas e outras acções, com a saída da mineradora Vale Moçambique, o nível socioeconómico da população da cidade de Moatize sofrerá drasticamente. Mas isto é só uma face da medalha. (Izilda Ivala & Queirós Armando)
2ª face da medalha: impacto ambiental
Um dos motivos arrolados pela Vale para sua retirada é sobre questões ambientais. De facto, a Vale e a indiana International Coal Ventures Limited (ICV) exploram minas a céu aberto na província de Tete, poluindo a região.
Uma pesquisa levada a cabo pelo Sekelekane, uma organização não-governamental, denuncia elevados riscos da actividade mineira à saúde da população de Moatize. O estudo foi divulgado em Junho de 2020 e analisou os impactos socio-ambientais da actividade de extracção de carvão mineral nas regiões de Moatize e Benga, abrangidas pelas mineradoras Vale Moçambique e International Coal Ventures Limited (ICVL).
Para além de descrever as mudanças resultantes da mina e elevados níveis de poluição sonora, da água e do ar, os resultados do estudo apontam que essas mudanças interferem na saúde da população incluindo os seus meios de subsistência: agricultura e pesca, por causa da poluição dos caudais dos rios e qualidade da água.
Outro estudo levado a cabo pela pesquisadora Ana Piedade Monteiro, da Universidade Zambeze indica que que a exposição ao pó de carvão, que é produzido durante o processo de extracção, pode provocar várias doenças respiratórias aos afectados. A pesquisadora apela para que “venha nos prontuários da saúde aquilo que acontece com a exposição ao pó de carvão para que os médicos possam diagnosticar melhor os doentes”.
O Diretor Executivo do Sekelekane, Tomás Vieira Mário, diz que é preciso também olhar para os impactos socioculturais da mineração em Moatize, acrescentando por exemplo que “tem havido ao longo de anos reclamações de profanação de campas, o lado espiritual das comunidades.”.
Por último uma sentença do Tribunal Provincial de Tete, assinada pelo juiz Justo Mulembwe de 26 de Janeiro, condenou a Vale por causa da vedação que a empresa construiu em redor da sua mina impedindo assim o acesso de 48 camponeses de Moatize, província central de Tete, aos seus campos de cultivo. “Há dano na medida em que a vedação causou, entre outros impactos, o bloqueio da estrada vicinal”, que era usada “pelos camponeses para chegar a Chidwé e outras regiões a sul da área concessionada”, lê-se na sentença.
(Kant de Voronha)