A participação dos cristãos na política
Por Dr. Tomas Selemane
“A política é um compromisso de humanidade e santidade” (Papa Francisco)
Quando nós falamos de participação política não estamos a falar apenas de militância partidária. Essa é apenas uma de muitas formas de participar na política, outras são: participação nas associações cívicas, movimentos de cidadania, grupos profissionais entre outras.
Os travões do desenvolvimento do nosso país, como temos vindo a apresentar nas passadas edições da VN, devem ser combatidos através da participação dos cristãos na vida social e política. De facto quanto mais os cristãos participarem da vida social e política, com espírito cristão, colocando em prática os ensinamentos do Evangelho, mais humanizada, solidária e justa será a nossa sociedade.
Politica, caminho de serviço
Papa Francisco nos recordou que: “a política é um compromisso de humanidade e santidade, e, portanto, um caminho exigente de serviço e responsabilidade aos fiéis leigos, chamados à animação cristã das realidades temporais”. Estas palavras são um apelo e, ao mesmo tempo, um desafio à maioria dos cristãos de Moçambique e de todo o mundo.
Por razões históricas, os cristãos em Moçambique e no mundo desenvolveram, ao longo do tempo, uma relação conflituosa com a política. Por um lado são conhecidas as relações de proximidade que práticas políticas opressivas e de exploração, como o colonialismo ou o apartheid, mantinham com as igrejas cristãs. Por outro, não esqueçamos que o património da Igreja, nomeadamente escolas, hospitais, internatos e habitações foram atacadas e nacionalizadas pela Frelimo revolucionária, que, a seguir a independência nacional, pregava o marxismo-leninismo.
E agora acolhemos os ateus de outrora, que regressaram ao convívio da fé, baptizaram os seus filhos e netos e muitos deles celebraram matrimónio e retomaram a vivência cristã. Este percurso histórico é intrigante para a maioria das nossas comunidades cristãs. Em parte porque falamos pouco da nossa história, e por isso, também a compreendemos muito pouco.
Ser cristão de fachada?
Em consequência disso, existem muitos cristãos católicos que consideram a participação na política como sendo incompatível com a sua vida cristã. Do mesmo modo, temos muitos cristãos católicos que por militância partidária, ou dever de ofício na política, muitas vezes decidem esquecer-se do seu compromisso católico, colocando em frente os seus interesses político-partidários. Talvez é por essa razão que havendo muitos cristãos nas nossas instituições políticas – tanto no Estado, no Governo, nos Municípios como nos partidos políticos – a nossa vida social e política continua orientada pelo ódio, pela violência, pela intolerância e por perseguições políticas.
Estudo relevante
Em 2018, a Comissão Episcopal de Justiça e Paz, realizou uma pesquiza e um estudo em todas as dioceses do país para procurar compreender como os nossos cristãos encaram “o papel do cristão católico na vida social e política em Moçambique.”
A realização desse estudo foi motivada pela “inquietação sentida pela Comissão Episcopal de Justiça e Paz devido ao avolumar-se das dificuldades de convivência pacífica entre os moçambicanos, fundadas na violação sistemática das regras básicas de boa convivência, e consciente da positiva influência que o Espírito evangélico pode exercer na promoção da paz, solidariedade recíproca entre grupos de interesses diversificados, promoção da justiça social e do bem comum.” Com essa motivação, o estudo procurou indagar sobre como fazer com que o rico património espiritual do Evangelho e da Doutrina Social da Igreja sirva de motor impulsionador do empenho ulterior dos cristãos católicos na vida social e política.
Difícil conectar
O estudo concluiu, de entre outros aspectos, que os cristãos católicos moçambicanos revelam uma grande dificuldade em fazer uma conexão entre o ser cristão e o ser cidadão comprometido; pelo contrário, fazem, inclusive, um esforço de separar a sua religiosidade da própria vida existencial nas áreas da política, da economia, da saúde, etc. É por isso mesmo que a sua participação na vida social e política do país tem sido exígua. O exíguo envolvimento dos cristãos católicos moçambicanos na vida social e política do país – resumiram os autores do estudo – “impede a cristianização da realidade política e socioeconómica, podendo ser uma consequência lógica do modo como vem sendo feita a formação cristã; a formação catequética que se administra nas Paróquias pode não ser suficiente para dotar os cristãos de conhecimentos e habilidades para afrontar problemas existenciais à luz da Palavra e da Comunhão com Deus.”
Box
Papa Francisco na sua Exortação Apostólica Gaudete et Exsultate (2018) sobre a Chamada à Santidade no Mundo Actual, nos lembra que para ser santo, não é necessário ser Bispo, sacerdote, religiosa ou religioso mas todos os cristãos são chamados à santidade. “Todos nós somos chamados a ser santos, vivendo com amor e oferecendo o próprio testemunho nas ocupações de cada dia, onde cada um se encontra. És uma consagrada ou um consagrado? Sê santo, vivendo com alegria a tua doação. Estás casado? Sê santo, amando e cuidando do teu marido ou da tua esposa, como Cristo fez com a Igreja. És um trabalhador? Sê santo, cumprindo com honestidade e competência o teu trabalho ao serviço dos irmãos. És progenitor, avó ou avô? Sê santo, ensinando com paciência as crianças a seguirem Jesus. Estás investido em autoridade? Sê santo, lutando pelo bem comum e renunciando aos teus interesses pessoais.”