AS REDES QUE NÃO PESCAM

“47O Reino do Céu é ainda semelhante a uma rede que, lançada ao mar, apanha toda a espécie de peixes. 48Logo que ela se enche, os pescadores puxam-na para a praia, sentam-se e escolhem os bons para os cestos, e os ruins, deitam-nos fora. 49Assim será no fim do mundo: sairão os anjos e separarão os maus do meio dos justos, 50para os lançarem na fornalha ardente: ali haverá choro e ranger de dentes” (Mt 13, 47-50).
A palavra rede é comum na linguagem do mundo actual. Do latim rete, o termo rede é usado para definir uma estrutura que tem um padrão característico. Existem múltiplos tipos de rede. Na actualidade, fala-se de rede mosquiteira; rede social; rede de pesca ou de caça; rede de amigos; rede de burladores; rede de corruptos; rede de bêbados; rede de injustiças; rede de trabalho; rede de pensamento, rede de computadores; rede eléctrica; rede de sustentabilidade; rede de interesses; rede ocupada, etc.
Assim, a rede exprime o conjunto de equipamentos ou acções interligados que partilham informação, recursos e serviços. Pode, por sua vez, dividir-se em diversas categorias, isto é, de acordo com o seu alcance; do seu método de conexão ou da sua relação funcional, entre outras. Ademais, toda estrutura em que diversos indivíduos mantêm vários tipos de relações designa ou constitui a rede, por haver um interesse em comum.
A Bíblia, no texto acima, fala do Reino de Deus comparado a uma rede de pesca. Nela os pescadores apanhavam tanto os peixes comestíveis quanto os impróprios. Em outras palavras, a rede traz peixes bons e maus. Devemos nos lembrar também que muitas espécies, naquele tempo, eram consideradas impuras de acordo com as tradições judaicas.
Na óptica do Evangelho, os discípulos de Jesus, presentes na humanidade devem convidar todos ao arrependimento, sem distinção. Mas devemos apontar para a forte realidade que o grande dia do juízo virá. Nesse dia, então, o ímpio e o justo serão separados. A isso se alinha também a parábola do trigo e do joio (Mt 13,24-46). Da mesma forma como o joio e o trigo crescem juntos na lavoura, sem que sejam separados até o tempo da colheita, também os peixes, bons e ruins, são apanhados na rede e permanecem juntos até que a rede seja arrastada à praia. Aí acontece ou decorre a selecção.
Mas diferente de tudo isso é a rede que não pesca. A rede que não evangeliza. A rede que desvirtua a mente e desconstrói as relações sociais. Refiro-me das redes sociais.
O mundo globalizado juntou, milhares de utilizadores numa rede (online), permitindo-lhes trocar mensagens e arquivos com outros membros da rede em breve tempo. Mas o interesse das pessoas nessas redes origina consequências sociais não abonatórias em muitos casos.
Várias experiências mostram que a confluência de culturas (nas redes sociais) gera novos comportamentos sociais. Em consequência disso, mais preocupa o imediato (whatsapp), o distante mas sempre presente (online). Privilegia-se o ausente e marginaliza-se o físico. Vemos pessoas que não dialogam, mas vivendo juntas. Existem pessoas que têm milhares de amigos online e fisicamente estão na solidão. Isso provoca ansiedade, preocupação, frustração, depressão, etc. Os conteúdos partilhados merecem ser ceifados entre bons e ruins.
Esta rede, apesar de juntar milhares de pessoas, não pesca por ser fonte de imoralidades. Apesar de criar facilidades de aquisição de conteúdos, livros, vendas e compras, informações e notícias há também atitudes e comportamentos que corrompem o coração humano.
Nas redes sociais há pessoas que tecem e alimentam a onda de criminalidade, promiscuidade sexual, imundície, nudez, falsidade, ilusões de vida fácil e aparências, boatos e fofocas, guerras e invejas, infidelidades e traições, ódios e vexames, etc.
Hoje em dia, a maior preocupação das pessoas é por aquilo que é fútil, passageiro, caduco. As pessoas procuram mais os “bifes”, os “podres”, os erros, os “gafes”, as quedas, os fracassos, os insucessos, as falcatruas, as derrotas, tudo alheio e fazer disso motivo de troça e fofoquice.
Razão pela qual, esta rede não pesca. Pouco interessa quando alguém partilha ou posta assuntos de aconselhamento, de conteúdos formativos. Isso não toca com o interesse da maioria das pessoas. Mas quanto a imbecilidades você encontra milhares de comentários. Será que o mundo gosta mais de coisas tontas e sem sentido?
Vejamos que poucas são as pessoas que se preocupam em partilhar a Palavra de Deus no seu mural. Parece que dá nojo e vergonha quando alguém partilha um versículo da Bíblia no facebook ou num grupo de Whatsapp. Se não for criticado como Mwèle (tonto) ou matreco, será considerado como um atrasado e amigo de padres e freiras. Ou será confundido por um pastor evangélico, recém-convertido ou um fundamentalista religioso.
A Palavra de Deus incomoda as pessoas de hoje em dia. São pessoas que não querem ser corrigidas, por isso agem com permissividade. Ninguém lhes pode contrariar. São pessoas que desejam fazer tudo ao seu alcance sem limites nem fronteiras.
Entretanto, para que o mundo não ande de pernas ao ar, é necessário que os jovens de hoje usem as redes sociais como instrumento de evangelização. Façam das redes sociais o novo areópago para divulgar a Palavra de Deus alcançando milhares de pessoas em simultâneo. Com efeito, cada um seria catequista, sem esperar ir a capela receber um grupo de 15 ou mais pessoas físicas. Aliás, no contexto planetário da Covid-19 notou-se que a sede por celebrações públicas pode ser saciada com a partilha da Palavra de Deus por estes instrumentos modernos.
Façamos das redes sociais um instrumento de correcção mútua; uma escola de moral e ética; um meio de partilha de valores humanos e divinos; uma arma de combate ao ódio, à guerra, ao terrorismo, as divisões, as brigas; um instrumento de promoção do bem comum.
Kant de Voronha, in Anatomia dos Factos