Quaresma, caminho de libertação
Não há sombra de dúvidas que vivemos num mundo quase eternamente quaresmal. Mundo de uma Quaresma quase sem Páscoa. Mas viver sempre ambiente quaresmal não passa de um círculo vicioso e venenoso para nossa vida espiritual e moral. Não restam dúvidas que no quadro das vivências humanas de famílias e amigos, entre homens e mulheres, haja sombra de vivência quaresmal sem Páscoa. Caminho perigoso e venenoso, já que a ressurreição de Jesus é tão disponível para tudo e para todos.
De facto, a sorte que temos é que a ressurreição, acção de Jesus Cristo, Filho de Deus vivo, não é exclusiva, mas aberta a todos seres humanos, entre você e mim. Entre nós e vós.
Uma Quaresma sem Páscoa perde seu sentido cristão, e se perde este sentido nós é que saímos a perder o profundo alcance da obra salvífica de Jesus Cristo. Na história da salvação, o povo de Israel ficou longo tempo à espera do Messias, escutando apenas o anúncio dos profetas e procurando viver com fidelidade, por vezes desobedecendo a Deus, mas sem perder a esperança da chegada de um Messias anunciado pelos profetas.
Neste mundo cheio de afrontas, crimes e injustiças, sobretudo aqui em Moçambique onde há sempre sinais que causam desespero, é sempre fácil cair na tentação de uma Quaresma sem Páscoa. É fácil perder a alegria do evangelho. Sobretudo ante o clima de ataques dos terroristas em Cabo Delgado (e noutros pontos), diante da problemática da Tabela Salarial Única, a famosa TSU, o desentendimento na vivência familiar, os múltiplos divórcios, o desemprego exacerbado, as fofocas, a greve dos médicos, etc. Estas situações colocam em causa a esperança de um mundo melhor. São realidades que nos afundam em cada dia e em cada noite numa Quaresma sem Páscoa.
Mas a esperança cristã, enraizada na pessoa de Cristo nosso Senhor, atesta-nos que estamos, neste tempo quaresmal, num caminho de libertação das nossas várias prisões da vida presente. O povo de Israel, apesar das dificuldades por que passava, nunca deixara esperar um mundo melhor, a acção libertadora de Deus. De modo que mesmo nós, diante da problemática da TSU, aflições existenciais, a nossa Quaresma conduz-nos sempre para o grande mistério da Páscoa, a Morte e Ressurreição de Jesus Cristo, nosso Salvador.
Assim, empenhados na oração, na prática do jejum e na caridade, a par e pouco percorremos este caminho da nossa libertação. Libertação das nossas inúmeras “quaresmas da vida”: a quaresma do sofrimento, a quaresma do egoísmo, a quaresma do ódio, da infidelidade, a quaresma do desentendimento e do desemprego, a quaresma de atritos familiares, a quaresma dos falsos messias, entre outros tipos. Unidos na mesma fé, percorramos este caminho da nossa libertação, buscando também libertar aos outros nas diferentes prisões e amarras da vida.
Pe. Serafim João Muacua