Quem é que defende quem não tem?
Recentemente fui implicado num caso judiciário que agora não estou a contar. Eu não tenho muitos recursos para pagar um advogado. Como posso fazer? Pode indicar-me se existem e onde posso encontrar as associações jurídicas que me podem ajudar? (carta assinada)
Nos noticiários costumo ouvir que pelo mundo fora existem advogados que defendem os direitos humanos de indivíduos ou de grupos contra a exploração e abuso de donos de empresa ou outros que defendem os direitos dos presos nas cadeias. Agora em Moçambique existe algo similar? Pode explicar quais são os direitos de um preso na cadeia se ele cometeu um crime e por isso está a pagar o mal à sociedade? (carta assinada)
Para responder às duas inquietações dos nossos amigos, questões que se complementam e com uma dose de similaridade, precisamos, contextualizar o tema dos direitos humanos. Como já se sabe, os direitos humanos são direitos básicos de todos os seres humanos. São direitos civis e/ou políticos, por exemplo, o direito à vida, à propriedade privada, liberdade de pensamento, de expressão, etc. ou seja, de todos perante a lei.
Consta da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para os outros em espírito e fraternidade”.
Ora, dissemos em ocasiões anteriores nesta mesma rubrica que, a Constituição da República do nosso país não se opõe àquele documento universal (DUDH) antes pelo contrário, nele se inspira. A título meramente exemplificativo dessa inspiração, o artigo 35 da CRM dispõe, quanto à universalidade e igualdade dos direitos que, “todos os cidadãos são iguais perante a lei, gozam dos mesmos direitos e estão sujeitos aos mesmos deveres, independentemente da cor, raça, sexo, origem étnica, lugar de nascimento, religião, grau de instrução, posição social, estado civil dos pais, profissão ou opção política”.
Mas mais do que isso, o Estado cria condições para que todo o cidadão, residente no país, tenha acesso aos tribunais, e garante aos arguidos o direito de defesa e o direito à assistência jurídica e patrocínio judiciário. Por outro lado, o arguido tem o direito de escolher livremente o seu defensor para o assistir em todos os actos do processo, devendo ao que por razões económicas não possa constituir advogado ser assegurada a adequada assistência jurídica e patrocínio judicial.
Na verdade, o arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo e salvas as excepções da lei, dos direitos de escolher defensor ou solicitar ao juiz que lhe nomeie um, como dispõe a alínea d), n.º 1 do artigo 69 da Lei n.º 25/2019, de 26 de Dezembro. Nos casos em que a lei determinar que o arguido seja assistido por defensor e aquele o não tiver constituído ou o não constituir, o juiz nomeia-lhe um. – N.º 2 e seguintes do artigo 72 da supra Lei n.º 25/2019, de 26 de Dezembro (Código do Processo Penal).
E quanto às instituições de defesa dos direitos humanos?
Como ficou dito nas linhas anteriores, todo o arguido tem o direito de ser devidamente defendido por um defensor, colocado à sua disposição pelo Estado moçambicano, independentemente do tipo de crime e o local onde tal crime tenha ocorrido.
Mas fora dos defensores colocados à disposição do cidadão “carenciado”, existem instituições que, sem custas, defendem os cidadãos e uma dessas instituições vocacionadas para defesa dos cidadãos ou dos arguidos com certa incapacidade económica/financeira é o Instituto de Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ), que podemos encontrar em qualquer distrito desse nosso vasto país.
A outra instituição que pelo menos podemos encontrar nas capitais provinciais é o Instituto de Acesso a Justiça (IAJ) da Ordem dos Advogados de Moçambique.
Mas fora dessas duas instituições para acesso e defesa dos direitos dos cidadãos, existe uma vasta rede de Organizações não-governamentais (ONG’s) vocacionadas na defesa e promoção dos direitos humanos no nosso país. Por exemplo: a Rede Moçambicana de Defensores dos Direitos Humanos (RMDDH) é uma iniciativa da sociedade civil moçambicana que tem como objectivo fortalecer a capacidade e a resiliência dos defensores dos direitos humanos, bem como melhorar a sua protecção e segurança no âmbito da sua missão de defender a dignidade humana, lutar contra injustiças e impedir o fechamento do espaço cívico.
Caro amigo, pode, querendo, recorrer a uma dessas instituições de defesa dos direitos do cidadão (IPAJ ou IAJ) ou a uma organização não-governamental ao nível de sua Província ou cidade para ter o competente acesso à justiça. Aliás, podemos até destacar que os técnicos do IPAJ estão sempre disponíveis para acompanhar juridicamente os arguidos e ou réus independentemente da sua situação penal.
Por: dr. Armando Ali Amade