Crónica: Não nos tapem olhos com peneira

Por: Giovanni Muacua

Tira o sono a cada moçambicano pensar sobre os ritmos eleitorais neste país. Há gritos de socorro em todos lados e cantos. Que Moçambique seja um país democrático, é duvidoso. Temos lindas leis no papel, mas a prática é outro nível. As eleições autárquicas de 2023 foram um completo desastre e pior ainda as provinciais e presidenciais. Não sei até onde iremos com a cultura eleitoral de enchimento de urnas.

O recente pleito eleitoral foi um dos mais desastrosos processos neste país. Um atropelo forte à lei eleitoral sob o olhar cúmplice de quem deveria garantir a justiça e a paz. Mas, inúmeras vezes, com cara sem vergonha, gritam pelas telas de televisão: “paz, paz, paz”, como se quisessem a paz, quando, na realidade, buscam semear confusões e guerras neste país.

Votar é um direito cívico e dever de todo o cidadão. Mas as manias desta gente matam a nossa democracia. Se o país é monopartidário que no-lo digam para não perdermos tempo a fazer teatros.

Que medidas vão tomar com eleitores que se dirigiram às assembleias de voto com claras identidades partidárias? E aqueles que carregaram inúmeros boletins de voto para encherem urnas, de quem os receberam? Que nos digam se rasgaram a lei eleitoral. Porque é que uns sem nome nas listas de voto votaram e outros na mesma situação, não?

No quadro da realização das últimas eleições, registaram-se vergonhas que seriam passíveis de ser evitadas. “Povo no poder é que deve decidir”.

Em pleno tempo de cada um colher o que semeou, há quem entende roubar, colhendo o que nunca semeou. A paz em Moçambique exige que cada um respeite o direito do próximo e cumpra o seu dever.

Tiveram todo o tempo para fazer campanha, manifestando cada um o seu projecto de governação. Porque é que o povo não pode ser livre de escolher o candidato que quer? A democracia implica respeitar a vontade do povo.

As eleições constituem um dos mais importantes pilares da democracia. As eleições democráticas, no dizer de Paula Becker e Jean-Aimé Raveloson (2011), devem preencher determinadas condições:

a)       As eleições democráticas são livres, quando os cidadãos podem escolher entre vários candidatos ou partidos políticos, que puderam candidatar-se sem quaisquer restrições. Do mesmo modo, eles podem decidir livremente, se os eleitores querem aproveitar o seu direito de votar ou abster-se;

b)        As eleições democráticas são iguais, quando cada cidadão, com direito a voto, possui um voto e quando nem a sua descendência nem o seu sexo, língua, rendimentos ou posses, profissão, classe, identidade sexual, nível educacional, religião e convicção política tenham influência na quantificação dos votos. Cada voto tem o mesmo valor.

c)         Em eleições democráticas não pode ser detectável, em qual partido político ou em qualquer candidato ou cidadão individual, votou. Elas são, portanto, secretas, quando cada eleitor possa meter, sem ser observado ou influenciado, numa cabine o seu boletim de voto dentro de um envelope e, a seguir, depositar na urna.

d)          As eleições democráticas são públicas e transparentes quando cada cidadão tem o direito de observar a contagem das urnas. Por outro lado, isto significa que o caminho dos votos dos eleitores, depois de depositados na urna e desde o apuramento até ao cálculo das somas totais e de uma eventual distribuição de assentos, deve ser completamente compreensível.

As eleições em Moçambique continuarão a ser antidemocráticas se continuarmos com a partidarização dos três poderes do Estado. De facto, é necessária uma verdadeira separação de poderes, para que o poder legislativo elabore e adopte as leis, o poder executivo implemente as leis e a política do governo, e o poder judicial representem o quadro legal para o exercício do poder.

Estejamos de olhos atentos e de bocas abertas para denunciar as atrocidades que ofendem os nossos direitos. É direito do povo conhecer o justo resultado do seu voto. Que quem de direito vele por esse processo e nos acuda de todos vícios. Não nos roubem o nosso direito. Porque fugir com o rabo à seringa? Não nos tapem com peneira. Ouviram?

Quem tem ouvidos, ouça!