Votamos e depois…que futuro político?

Por: Dr. Deolindo Paúa
Apesar das várias contestações que os resultados das últimas eleições nos trouxeram, elas confirmaram, ainda que questionável, a vitória da Frelimo e do seu candidato. Vamos continuar a ser governados por um Partido que pouco faz para o desenvolvimento geral de Moçambique, um partido muitas vezes comprometido mais com interesses de facções internas do que com os interesses de Moçambique como pátria de todos. Estas eleições nos disseram também que a RENAMO pode deixar de ser o partido que lidera a oposição e ceder lugar ao partido PODEMOS, o qual, graças à popularidade de Venâncio Mondlane conseguiu afirmar-se no panorama nacional e adquirir assentos na Assembleia da República.
Consequências políticas da perda da hegemonia da Renamo?
A Renamo perde hegemonia em consequência do mau cálculo que terá feito em relação ao fenómeno Venâncio Mondlane. Tal como tenho insistido, infelizmente os partidos políticos que temos até agora não são movidos pelo patriotismo. O que lhes faz entrar e permanecer na luta política não é a intenção de mudar as coisas em Moçambique. Mas a sua energia deriva da intenção que cada partido tem de substituir a Frelimo, para poder, por sua vez, beneficiar-se do erário público. É isto que vitimou a Renamo e o seu líder. Movido pela apetência pelo poder e pelas regalias do estatuto de líder da oposição mais votado, Ossufo Momade e seus próximos, perderam a ocasião de ler as tendências da sociedade Moçambicana, negligenciaram e baniram Venâncio Mondlane tornando-o seu adversário político e, pior, nas eleições, o subestimaram. Venâncio Mondlane tinha ainda muito a dar à Renamo. A sua forma de fazer política teria ajudado a Renamo a realizar a necessária metamorfose de uma política assente na guerra e nos conflitos, tal como aconteceu nos últimos 30 anos de democracia eleitoral, para uma política assente no direito e no uso das leis. Por esse erro estratégico a Renamo deverá, no futuro, lutar para se reerguer. O posto de maior partido da oposição será perdido e com ele, todas as regalias oferecidas pelo Estado. No seu lugar poderá estar um partido desconhecido, o partido PODEMOS.
Como ficam as regalias do segundo líder do partido mais votado?
Desde que entrámos na Democracia eleitoral, há acordos que o governo tem feito com a Renamo, que muitas vezes foram objecto de questionamento. Por exemplo, a Paz tinha sido sempre propriedade de dois partidos, a Frelimo e a Renamo. Até agora, sempre que se falava de paz, a ideia de todo o Moçambicano era de que a Renamo e a Frelimo tinham que deixar de provocar confusão e que a falta de paz era criada por esses dois partidos. Por isso, a ideia da paz em Moçambique nunca foi necessariamente uma propriedade Nacional.
Por isso, todos os acordos relativos a tal, foram sempre para acalmar a Renamo que reclamava algo que a Frelimo lhe tinha feito. É no mesmo espírito que foi criado o estatuto do líder do partido mais votado. Na verdade, mesmo que a letra indique que qualquer líder de qualquer partido pode beneficiar dele, a intenção original e genuína, o verdadeiro espírito de tal lei visava acomodar o líder da Renamo, na pessoa específica de Afonso Dhlakama. Visava persuadir Dhlakama a abandonar as matas para ir ao conforto da cidade com as regalias necessárias garantidas. Acreditava-se que, com isso, Dhlakama poderia deixar de criar conflitos a cada descontentamento que a Frelimo lhe provocasse. Essa forma de conceber uma lei foi um erro, porque não se pensou numa oposição que muda, nem na possibilidade da Renamo perder a posição de líder da oposição. Não se pensou que alguma vez a Renamo podia não ser o 2º partido mais votado.
A popularidade do PODEMOS nestas eleições pode esvaziar o espírito da lei sobre as regalias da Renamo inscritas em letras disfarçadas de lei aplicável a todos. Por isso a pergunta que fica agora é: o PODEMOS vai assumir o posto de maior partido da oposição mais votado com todas as regalias inerentes? Qual é a possibilidade da Renamo reclamar o seu direito que está no espírito da tal lei, mas não está na sua letra?
O beneficiário da desordem da oposição é a Frelimo
A Frelimo ganhou estas eleições não porque seja o melhor partido, muito menos por ter sido realmente votada. Por isso é justo pensar que a Frelimo ganhou porque com a confusão da oposição, teve mais oportunidade para mobilizar eleitores indecisos, teve a chance de controlar sozinha. Uma oposição desavinda facilita a fraude e as mentes de políticos interesseiros e sem patriotismo dificilmente vão compreender isto.
Que lições param o futuro?
É triste saber que, apesar das manifestas irregularidades que o processo eleitoral apresentou, a Frelimo saiu vencedora. No entanto, precisamos de reconhecer que a nossa democracia está em franco crescimento. Todos os actores políticos envolvidos precisam de aprender com estas eleições que deixaram lições claras para cada um dos seus actores: a Renamo deve parar de fazer acordos sucessivos com a Frelimo, sobretudo quando esses acordos viabilizam fraudes em troca de benefícios de seus líderes; a Frelimo deve abandonar a sua forma de governação elitista, opressora e arrogante, pois os caminhos de mudança indicam que ela não tem legitimidade suficiente para continuar a governar, apesar de o fazer a força; o MDM deve deixar de ser um partido oportunista e tribal e tornar-se um partido democrático com um programa concreto de resgate da dignidade dos moçambicanos; o partido PODEMOS deve aproveitar a ocasião para consolidar a sua existência e demonstrar que pode ser alternância política credível. Os votos de que beneficiou agora não o podem iludir com a ideia de ter popularidade, mas podem ser alavanca para o seu posicionamento. É bom entender que nestas eleições os moçambicanos não votaram no PODEMOS, eles apenas deram apoio ao Venâncio que acreditavam ter um projecto de realizar os seus anseios. Se o PODEMOS não compreender isto, a sua presença na Assembleia da Republica será apenas momentânea; Venâncio Mondlane foi vítima de apoios emprestados. Se pudesse pensar para o futuro numa forma de ter uma base de apoio que lhe seja fiel aos princípios, ofereceria nos próximos ciclos políticos mais uma alternativa política ao país. O país precisa de mais e melhores alternativas políticas. Cabe ao Venâncio Mondlane capitalizar a sua hegemonia e oferecer essa alternativa.