
46 anos de Independência: 2 perguntas
Há 46 anos, no dia 25 de Junho, o 1º Presidente de Moçambique proclamou a Independência do País. Samora Machel no seu discurso afirmou: “Nasce a República Popular de Moçambique como fruto da vontade inquebrantável, da determinação férrea do Povo Moçambicano de reconquistar a liberdade, gozar do direito supremo e inalienável de todos os povos a independência nacional… é preciso antes de mais a necessidade da unidade ideológica; por outras palavras a lição da prática é de que não basta a unidade fundada na negação do inimigo e na simples reivindicação de independência. É fundamental que a unidade se faça em vista de uma definição clara e inequívoca de princípios do que queremos, como queremos, que sociedade nós propomos a construir”.
1ª Pergunta: Depois de 46 anos quais são os princípios fundamentais que garantem hoje a unidade nacional e a sua identidade?
Outra voz que marcou o 25 de Junho de 46 anos atrás é a de Dom Manuel Vieira Pinto, que por ocasião da Independência Nacional escrevia as comunidades cristãs nestes termos: “A Independência é o momento mais alto da vida de um povo. É a Páscoa do povo moçambicano – páscoa que actualiza a grande Páscoa feita de uma vez para sempre por Cristo Jesus. A era colonial acabou. O homem nascido da luta pela independência é um homem revolucionário. E revolução é viragem, ruptura, invenção, criatividade; é transformação do mundo selvagem em humano, de humano em mais humano, mais fraterno, mais solidário. A revolução assim entendida exige espírito de serviço, abertura permanente ao novo, disponibilidade, pobreza, liberdade, amor, audácia e risco. Aqui se situa o dinamismo do Evangelho. Criar o homem novo é criar a sociedade nova.
A fé em Jesus Cristo não é um refúgio, nem uma abstracção. Não se reduz a um conjunto de práticas religiosas, nem desconhece os dinamismos profundos da história. A fé verdadeira não aliena. Insere o crente na história como fermento na massa e como sal na terra (Mt 5, 13). O divórcio entre a fé e a vida é antievangélico”.
2ª Pergunta: Hoje as comunidades cristãs estão a testemunhar com coragem o dinamismo do Evangelho que cria o homem e a mulher nova para a construção duma sociedade mais equitativa e fraterna?
A resposta a estas duas perguntas pode-nos ajudar a viver com esperança e autenticidade os 46 anos de Independência. De facto, a consolidação da unidade nacional, que se identifica nos princípios fundamentais que garantem as liberdades, o bem-estar das pessoas e as suas necessidades, constitui a identidade da nação que, junto com a vivência duma fé encarnada dentro da história, hoje nos desafia. E todos temos que responder a este desafio se queremos continuar a respirar aquele ar de genuinidade, igualdade, liberdade, bem-estar comum e responsabilidade que 46 anos atrás contribuiu para construir uma nação independente.
Hoje o País vive momentos trágicos; a pandemia da covid-19 influenciou negativamente o campo económico e social; continua a dependência das ajudas externas aumentando aquilo que poderíamos chamar de “colonialismo económico” e, enfim, parece que a soberania nacional está também ameaçada na Província de Cabo Delgado onde está-se a viver uma verdadeira tragédia humana e social por causa dos ataques terroristas nos distritos nortenhos da Província.
Numa recente entrevista houve quem perguntou a Dom Luiz Lisboa, bispo emérito de Pemba: “o que é que você carrega no coração dos 20 anos vividos em Moçambique”? Ele respondeu “O mais bonito foi ver aquela gente tão pobre acolher outros pobres em suas casas (c.f. referência aos refugiados internos que fugiram das zonas e que foram acolhidos pelos familiares seja na província de Cabo Delgado como em Nampula). Eles acolhiam duas ou três famílias, não tendo quase nada, nem espaço, nem comida. Isso eu nunca vou esquecer. São exemplo de compartilhamento humano”. E assim, se no meio de tão grande tragédia e desespero, como Dom Luiz nos recordou, podem surgir exemplos de corajosa solidariedade, com certeza Moçambique poderá ser orgulhoso da sua independência com o resto do mundo.
Enfim que o vento da frescura e genuinidade de 46 anos atrás possa continuar a soprar para revigorar a história presente com a participação de todos. Hoje não é tempo de ter espectadores, mas sim, de termos atores para que Moçambique volte a ser a casa comum para todos.