A próxima pandemia são as mudanças climáticas

Depois da pandemia da Covid-19, o mundo vai ter de enfrentar – na verdade já enfrenta – a pandemia das mudanças climáticas, alertam peritos ambientalistas e o Papa Francisco.
Desde o ano passado, por cauda da Covid-19, o mundo foi se adaptando a novas formas de viver, igrejas fechadas, teletrabalho, aulas à distância, reuniões virtuais, compras online, menos convívios entre amigos, reduzidas visitas familiares, velórios e funerais com limitada participação de familiares e amigos, enfim, uma nova maneira de organização da nossa vida. Infelizmente, essa nova forma de vida não fez desaparecer a pandemia da Covid-19 ela continua entre nós.
A outra pandemia
Os ambientalistas e o mesmo Papa Francisco alerta-nos que a próxima pandemia chama-se mudanças climáticas: as alterações de temperatura provocadas no planeta terra em que vivemos, que passou a aquecer muito mais do que era, resultando num ciclo desordenado das estações do ano. Os verões e os invernos passaram a ser mais intensos, por vezes mais curtos e noutros anos mais longos. As inundações passaram a ser mais constantes e de forma mais severa. As secas deixaram de ser eventos extraordinários que só cabiam nas histórias narradas pelos mais velhos, passando a ser uma realidade que todos nós conhecemos porque vemos acontecer um pouco por todo o país.
Mudanças em Moçambique
Entre 2016 e 2019, as províncias do sul enfrentaram graves secas que levaram à perda massiva da produção agrícola, gerando graves crises de fome em Inhambane, Gaza e província de Maputo. Em 2019, as regiões centro e norte foram atingidas por dois grandes ciclones: os dois ciclones de categoria 5 – Idai e Keneth. Primeiro foi o ciclone Idai que fustigou a capital da província de Sofala, Beira, matando mais de 600 pessoas só em Moçambique, mais de 300 no vizinho Zimbabwe e 60 pessoas no Malawi. A seguir, outro ciclone Kenneth atingiu Pemba, capital da rica província de gás de Cabo Delgado. Estes eventos mostram que a pandemia das mudanças climáticas já se abateu sobre nós moçambicanos. As causas? O modelo de desenvolvimento económico que o nosso país e o mundo abraçaram: muita dependência na extracção de recursos naturais e minerais (areias pesadas e pedras preciosas, carvão mineral, florestas e gás natural).
Os recursos naturais chegaram no fim?
A aposta na extracção de minérios chegou a um fim de ciclo. A extracção do gás de Pande e Temane, em Inhambane, já tem um fim à vista – segundo estimativas da empresa petroquímica Sasol, não sobram mais do que 15 anos de extracção; o carvão de Moatize já está no fim da linha. Em Janeiro deste ano, o gigante brasileiro da mineração Vale anunciou que estava se retirando dos projectos moçambicanos de carvão na província de Tete como parte de seu compromisso de emergência climática para acabar com a produção de carvão. O anúncio foi feito 15 anos depois de a província carbonífera moçambicana de Tete ter-se tornado um lugar imaginário nos sonhos de empresas, funcionários, pequenos e médios empresários, um El Dorado Tete, como eu e o colega economista João Mosca intitulámos o livro que publicámos em 2011.
Como enfrentar o problema?
Temos respostas para essa pandemia das mudanças climáticas? Temos sim, mas são difíceis de implementar, tal como o são todas as medidas de política que visam a sobrevivência dos povos e das nações. Sob o lema Unindo o mundo para enfrentar as mudanças climáticas, a próxima Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP 26) — a ter lugar em Glasgow, no Reino Unido, entre os dias 01 e 12 de Novembro de 2021 — reunirá representantes de cerca de 200 governos com o objectivo de acelerar a acção climática para cumprir o Acordo de Paris. Esse acordo rege as medidas de redução de emissão de gases estufa a partir de 2020, a fim de conter o aquecimento global abaixo de 2 graus centígrados, preferencialmente em 1,5 graus centígrados, e reforçar a capacidade dos países de responder ao desafio, num contexto de desenvolvimento sustentável. O acordo foi negociado em Paris, capital da França, durante a COP21 e aprovado em 12 de Dezembro de 2015.
BOX
“À vista da deterioração global do ambiente, quero dirigir-me a cada pessoa que habita neste planeta. Na minha exortação Evangelii Gaudium, escrevi aos membros da Igreja, a fim de os mobilizar para um processo de reforma missionária ainda pendente. Nesta encíclica, pretendo especialmente entrar em diálogo com todos acerca da nossa casa comum” (Papa Francisco Encíclica “Laudato Si’).
Desta forma, conforme nos exorta o Papa Francisco, a nossa resposta aos desafios e ameaças das mudanças climáticas deve consistir primeiro na tomada de consciência da degradação das condições de vida neste planeta Terra, por via dos eventos climáticos adversos; segundo, devemos mudar de atitude individual e colectiva, como famílias, comunidades e países. Devemos proteger este planeta, pois trata-se de proteger “a nossa casa comum.” Em termos práticos e concretos, devemos repensar o nosso modelo de desenvolvimento que assenta na extracção massiva, descoordenada e inconsequente de recursos naturais; precisamos de adoptar novas práticas de agricultura, com menos queimadas. A “casa comum” espera por nós, protejamo-la!
Por Tomás Selemane